segunda-feira, 13 de agosto de 2012

Depressão pós-parto

Aceitar a gravidez na adolescência não é tarefa fácil... Lidar com a depressão após o nascimento do bebê também não! 

Bruno B. Soraggi

Luana* se lembra “perfeitamente” daquele dia 24 de dezembro de 2000. Não por ser a última véspera de Natal do milênio, mas pela chegada de um presente inesperado. Então, com 19 anos de idade, a garota descobriu, no banheiro da casa da família de seu namorado, que estava grávida. A data foi tão marcante que até hoje, quase nove anos depois, ela consegue descrever detalhadamente tudo o que aconteceu naquela tarde. “Fomos ao shopping e eu comprei uma TV de presente para o meu namorado. Na volta, conversamos sobre o atraso da menstruação. Já estávamos aflitos, então ele comprou o teste. Nem esperamos pela primeira urina da manhã, fizemos logo e saiu o resultado”, conta. “Positivo!”.

“Eu fiquei nervosa. Ele me abraçou, feliz. Me acalmou”, diz. A notícia, porém, só foi repassada à família após as festas de final de ano. “Essa parte foi ‘engraçada’. Eu estava na faculdade e ele foi para minha casa contar para os meus pais sem eu saber, sozinho. Minha mãe não gostava muito dele, então eles contam que ele tremia muito, mas teve coragem de enfrentar todo mundo. Eu gostei dessa postura dele”, lembra. Daí para o próximo passo, sendo ela de família “tradicional muçulmana”, não havia muito que pensar: como abortar estava “fora de cogitação”, eles deveriam se casar. Foi o que aconteceu no dia 10 de fevereiro do ano seguinte. 


30 aos 20

“Ele já falava em casamento [antes], mas eu não queria. Achava que era muito nova. Eu gostava muito dele, mas ele tinha 20 anos. Ele era técnico em informática, não ganhava bem. Tanto que andávamos a pé para economizar dinheiro para o McDonald’s. Não tinha condições de casar. Já eu tinha uma família que me dava tudo, não queria trocar esse conforto”. 

“Ele até tinha um apoio financeiro do pai, mas não era isso que eu esperava de um homem. Para a minha família, sair de casa é sair de casa. Ela dá apoio para o filho levantar voo, mas dali em diante é com ele. Fui criada assim e esperava o mesmo dele; que ele assumisse o controle. Que com ou sem dinheiro fizesse o possível para garantir a estabilidade familiar”. 

Não que ela pretendesse ser sustentada. Luana também almejava um dia ter um emprego. “Meu projeto de vida era estudar, me formar, fazer um bom estágio e trabalhar para uma grande empresa. Eu não tinha essa necessidade antes de me formar, mas a gravidez mudou todos os meus planos. O que eu pensava que só iria acontecer aos 30 aconteceu aos 20”, lamenta. Apesar disso, na época, a jovem projetava para seu futuro um casamento feliz. “Ninguém casa pensando em se separar”, constata a garota, já adiantando o desdobramento da relação. 



Depressão, raiva e rejeição

Do matrimônio ao divórcio, que foi oficializado em 2003, o que se sucedeu foi uma temporada de depressão, rejeição e raiva, que acabaram por esfriar tanto a relação marido e mulher como a mãe e filha. “Casar não estava nos planos, interromper a faculdade não estava nos planos... Com a gravidez, e a antecipação de tudo isso de forma desestruturada, fiquei confusa”. 


Já durante a gravidez, as consequências físicas próprias da gestação começaram a afetar Luana. “Eu sempre fui alta, magra e bonita. Tanto que quando era mais nova, fui convidada para fazer umas fotos e eventos, mas nunca aceitei. Mas eu chamava a atenção. Só que durante a gravidez, fiquei enorme! Engordei 18 quilos”. “Além disso, eu tinha o cabelo loiro, mas não podia pintar. Então a raiz ficava ridícula. Aí fui lá e cortei bem baixinho, tipo Joãozinho. Daí fiquei mais ridícula ainda. Eu me sentia mal, não me aceitava”. Ela tampouco aturava seu marido. “Eu não queria sexo e, às vezes, até ouvir a voz dele me incomodava”. 


Pós-parto

Até que Lara nasceu, “perfeita”. Durante os primeiros dias, Luana e a recém-nascida ficaram na casa dos pais da jovem para que a nova avó a auxiliasse. “Eu não queria voltar para casa, queria ficar na casa da minha mãe. Eu só dormia. Era minha mãe quem pegava minha filha e trazia para que eu a amamentasse. Minha mãe fazia tudo: deu o primeiro banho, trocava a fralda... Eu só amamentava, e mesmo assim com raiva. O choro dela me irritava muito”. Quando voltou para sua própria residência, as coisas ficaram piores. “Fiquei ainda mais nervosa, porque eu teria que fazer todas aquelas coisas”. “Os pontos da cesariana doíam, minha cara estava péssima... Quando chegava a noite, eu ia dormir e e o marido é quem cuidava de tudo”.


Certo dia, no limite de sua paciência, Luana tomou a atitude mais drástica desde que entrou em seu período depressivo. “Eu estava louca, já. Durante o dia, ela chorava a cada dez minutos. Até que um dia eu não aguentei mais e chacoalhei ela com força. Me arrependo até hoje”. Com tudo isso, em menos de um mês seu leite secou e a bebê se viu obrigada a beber leite industrial. “O pediatra depois recomendou outro leite, mas que custava muito caro. Lembro-me até hoje: meu marido saiu para conseguir esse leite, mas o dinheiro não dava. Ele foi andando até a fábrica, no Brooklin. Chegou em casa chorando, porque não tinha conseguido. Mas o pai dele foi nos visitar naquele dia e disse que seria o responsável pelo leite dela até quando fosse necessário”, recorda. 


Auxílio na reconquista

Luana continuava “estressada, ansiosa e, ao mesmo tempo, muito triste”. Foi então que decidiu procurar um médico, que a indicou um psicólogo, que a encaminhou para um psiquiatra que, por sua vez, prescreveu medicação. “Logo comecei a tomar Rivotril”. A mãe da jovem também se mudou para a casa da filha. O tratamento de Luana durou até que Laura completasse sete meses de vida. “Nesse tempo, nossa relação [marido e mulher] esfriou muito. Não tínhamos mais nenhum tipo de intimidade. Ele me procurava e eu não correspondia. Ele sempre foi um pai exemplar, coruja. Cuidou muito bem da Lara nessa fase. Ele foi pai e mãe ao mesmo tempo. Eu só vivia azeda”. 


Com o término da terapia, Luana retomou seus estudos no segundo semestre de 2002. “Voltei a ocupar minha mente, a me sentir útil. E voltei a me interessar por algumas coisas, como o sexo”. Para o casamento, porém, isso já se fazia tarde. “Depois de tanta rejeição, ele já não tinha interesse em estar comigo. Tentamos ficar juntos, eu implorava para darmos uma nova chance. Tentei reconquistar minha família, mas foi em vão”.  Separada, a jovem retornou à casa de seus pais. “Continuei minha faculdade e comecei a dar uma atenção especial para a minha família, porque vi quanto mal eu fiz, só que eles eu ainda poderia reconquistar”. E conseguiu. 

Hoje, Luana se considera uma mãe feliz e “apaixonada” por sua filha. “Apesar de separados, ela tem um pai e uma mãe que babam por ela. Ele nunca se afastou dela e temos uma relação muito saudável. Está tudo superado”. Seu atual namorado também tem uma filha de outra relação. “Então não corro o risco de uma nova gravidez. Quer dizer, risco tem, só não está nos planos...”, conclui a jovem. 

*O nome da personagem foi trocado para preservar sua identidade.


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